Eu tava tentando tirar alguma coisa do meu violão completamente desafinado quando lembrei da primeira música ensinada no Cap: pra não dizer que eu não falei das flores. Mas eu só lembrava o iniciozinho da música porque tocava num comercial aí sobre qualquer coisa. Então eu fui no youtube, digitei o nome da música, escolhi o primeiro vídeo da lista, esperei carregar e depois que eu assisti... de repente o violão; o fato de eu estar aprendendo a tocar violão... me pareceu ridículo. Soava como uma afronta, como se eu tivesse segurando a prova da minha alienação; como se eu tivesse virando a cara pro mundo e decidindo viver um sonho de vidro fosco. Nada demais na verdade, uma sensação com essa eu, e milhares de pessoas como eu (que têm uma casa, comida, relativa segurança, dinheiro e uma tv), já senti diversas vezes. Sabe como é: culpa pelas crianças morrendo de fome na África, por aquelas pedindo esmola no sinal, por aquelas das fotos no jornal mortas por bombas, e etc, e você aqui, no computador, de barriga cheia, com pai e mãe e escola bacana, e etc. E então você decide nunca mais estragar comida e bolar um plano pra mudar o mundo; e talvez isso dure uma semana, talvez duas, mas daí depois você só segue em frente. É um clichê de vida, se é. E dessa vez pra mim talvez só seja mais uma vez, mas... se vocês puderem ver o vídeo AGORA e derem pause aos 52 segundos...
Sério, vão ver o vídeo antes de continuar.
(http://www.youtube.com/watch?v=5rtU0pg-kkw)
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Mas aí veio esse menino da foto. E, se querem saber, de primeira eu nem reparei em seus membros faltosos, porque eu estava muito ocupada me assustando com o olhar dele. Quer dizer, olha pra ele, não é só um olhar de uma criança perdida, ou com fome, ou desesperada. Eu preferia vê-lo gritando da mais pura raiva a ver aquele olhar de novo. O olhar de um adulto
Foi isso que eu senti, e então eu fiquei encarando a foto por bastante tempo até ver só... um menino de novo; perdido, desesperado, gritando de agonia e dor, desolado, fechado e marcado. Talvez ele nunca tenha tido a chance de aprender a andar... E não é só uma foto, é um alguém real que está por aí. É real... e ele existe. ESSE MENINO EXISTE!!!
Eu sei: você sabe disso. Talvez só eu não soubesse com certeza, e a revelação me deixou um pouco tonta. Não é como um filme com final trágico que você assiste várias vezes na esperança de que se, talvez, se você assistir de novo, o final mude, e tudo fique muito-bem-obrigado; é mais como um agora muito longe e extremamente difícil de ser alterado e completamente impossível se você quiser ficar sentado com esse seu traseiro gordo nessa cadeira pensando em o quanto o mundo é realmente injusto. Isso é uma mensagem pra mim, só pra frizar.
Ok, dessa vez nada de planos pra instituir uma reforma agrária mundial, nem de socar os políticos até que eles se tornem justos, porque não dá mais pra esperar mais ninguém começar alguma coisa pra que eu simplismente concorde ou amaldiçoe. Porque eu posso começar alguma coisa, de verdade. Posso mesmo. Talvez a África seja muito longe, e a faixa de Gaza um lugar para se virar uma peneira; mas quer saber? Há taaantas coisas pra fazer... Eu não posso fazer todas, não mesmo, mas posso escolher uma, certo? Imagine um gigantesco pote de vidro cheio de pequenos papeizinhos (um pote muito, muito grande), e em cada pedaço de papel: um problema; que vai desde a chateação de um menino com sua bola de futebol furada até grandes guerras.Mas esse pote é especial, porque, além de ter esse tamanho absurdo, ele é mágico. Se é. Dele só se tiram os papeizinhos certos para o que está ao alcance da pessoa que o tirou. Isso não é Deus, nem destino, isso é... uma coisa que simplismente acontece. Vou pegar um. Ainda não sei o que tá escrito, mas tenho certeza de que é realizável. Tenho um rastro de idéia do que seja, mas não vou olhar agora. Sabe o que eu vou fazer nesse exato momento? Desalienar. Eu acho política uma das cinco coisas mais chatas do mundo, mas vou fazer um esforço pra ter interesse. Nem tão cedo eu vou ter um partido de preferância ou uma proposta governamental, ou vou entender o que está acontecendo no mundo; mas o começo é sempre assim, muito mais difícil.
Ah! Isso não quer dizer que eu vá parar de treinar violão, ler livros de ficção, assistir filmes e seriados compulsivamente ou deixar de fazer qualquer uma dessas coisas que eu goste. Eu só tô acrescentado uma coisinha a mais.
Nó cego
Há 10 anos